Como ler as histórias?

Propomos que cada visitante visite e leia da maneira que apetecer. Cada leitor pode vaguear pelos textos, pode deter-se nas fotos e observar detalhes que despertam a curiosidade. Pode, ainda, evocar e partilhar as suas próprias memórias com outras pessoas. Talvez se decida finalmente a procurar a caixa onde foi amontoando fotos e revisitar as memórias a que as fotos estão vinculadas.

Se é verdade que as histórias não têm uma ligação direta entre elas, também é verdade que após a leitura de algumas histórias o leitor pode reconhecer alguns elos de ligação, seja pelo modo de subsistência dos protagonistas, seja porque ocorreram no mesmo período de tempo, ou no mesmo local.

As fotos seguintes são um pretexto para comentar formas de ler e interpretar as histórias e os fragmentos de memórias associadas. Fazem parte do acervo da coleção visitável do Pátio das Memórias do Alentejo Litoral.

As quatro primeiras fotos são “antigas”, a preto e branco. A leitura para além da descrição dos elementos da foto abre caminho ao conhecimento de momentos de viragem significativa no modo de vida e de subsistência da família de Rafael Rodrigues Pai-Avô, à semelhança do que aconteceu com muitas outras famílias.

Na Foto 1, de 1940, os fundadores da Casa, o Lavrador Rafael Rodrigues e Bernardina, a esposa, encontravam-se na fase final da sua existência. Viviam do que cultivavam na terra e do que comercializavam, nomeadamente o vinho de talha, na “Venda da Tia Bernardina”, no nº 94 da R. Marquês de Pombal.

A sua vida cruzou-se com a vida dos pescadores. Atente-se na rede de pesca, usada como cortina que protege a porta do quintal, e na grelha para assar peixe, suspensa na parede.

Os sinais de problemas de saúde de Bernardina podem prestar-se a pesquisas sobre doenças do foro reumatológico, por exemplo.

Na Foto 2, do final da década de 40 do séc. XX, o “carro de bestas” era o carro de transporte da família.

O ciclo da atividade agrícola aproximava-se do fim, após o falecimento de Rafael e de Bernardina.

Maria Luísa (com roupa negra, de luto), neta de Rafael e Bernardina, era o último elo de ligação da família à atividade agrícola.

Na Foto 3, de 1955, as netas de Rafael Rodrigues visitaram Sines nas férias e foram “dar um passeio à Ribeira”.

Esta fotografia ilustra o ciclo da emigração para Lisboa e dos regressos a Sines para lazer.

A casa do Lavrador Rafael Rodrigues passa a casa de férias estivais. Durante o resto do ano permanece fechada.

Na Foto 4, da década de 60 do séc. XX, Virgínia, a primeira neta de Rafael Rodrigues Pai-Avô, foi também a primeira mulher da família a conquistar a autonomia financeira graças ao rendimento do trabalho como “empregada no comércio”. Virgínia foi uma orgulhosa e dedicada “empregada dos Grandes Armazéns do Chiado”, em Lisboa.

A casa do lavrador ficou desabitada no nº 94. O nº 92 estava alugado para a atividade comercial de Carlos Coelho e Maria José Caetano Raposo. As terras de cultivo que outrora tinham assegurado a subsistência da família foram expropriadas pelo G.A.S.-Gabinete da Área de Sines, no início da década de 70.

A Foto 5, de 2016, inspira a interrogação: Como as “pegadas” humanas vão marcar o território e as gentes de Sines e do Alentejo Litoral?

Como o estudo das memórias das gentes do Alentejo Litoral poderá contribuir para

…a valorização das pessoas que construíram as “paisagens anteriores”?

…a participação na construção das novas “paisagens”?

(*) Agradecimentos a Sandra Patrício, Técnica Superior do Arquivo Municipal de Sines, pelo apoio à edição digital das fotos antigas (fotos 1, 2 e 3).



O projeto do Pátio das Memórias do Alentejo Litoral é uma teia que se vai tecendo e nunca está completa. Junte-se a este projeto e contribua com as suas histórias e memórias para um retrato ainda mais nítido desta região do Alentejo.