O nome do meu pai era João da Encarnação. Chamavam-lhe João dos Santos em virtude de ter um irmão chamado Francisco dos Santos.

O João dos Santos era um bom jogador, jogou no Clube Sport Lisboa e Benfica, em Faro. Mais tarde foi jogar para Olhão e ingressou no Sporting Clube Olhanense, em 1940 provavelmente. Quando se encontrava em Sines treinou uma equipa de futebol em Sines, o Vasco da Gama, salvo erro.

O meu pai tinha uma fábrica perto do mar, em Sines. Não sei onde ficava. Eu não sabia do trabalho do meu pai. Ele dizia que não ligávamos às coisas. Acho que era ali para os lados de S. Rafael ou do Pontal.

Quando houve uma tempestade muito forte, em 1952, foi um ciclone, arrasou muitas casas, muitos telhados. Eu tinha 15 anos. A fábrica do meu pai ficou toda destruída porque ficava ao pé do mar. Então ele pediu autorização para montar a caldeira no quintalão da casa [na R. Marquês de Pombal, 92-94, Sines] para cozer cortiça. Nós alugámos a casa para viver e ele passou a trabalhar no quintalão com a caldeira.

Ele ia muitas vezes à Sonega comprar cortiça. A cortiça ficava no quintalão.

Mas ao fim de dois anos o meu pai teve que parar a caldeira. Havia uma chaminé no caldeirão e fazia muito calor para a parede. Foi um sócio da proprietária que não gostou que o meu pai tivesse a caldeira a funcionar. A proprietária da propriedade contígua não queria fumo e fez queixa à Câmara.

Em setembro de 1955 fomos para Grândola, os meus pais, eu e as minhas irmãs. O meu pai continuou a trabalhar na cortiça. Eu é que fazia a contabilidade. Depois fomos para a Cova da Piedade. Nessa altura o meu pai já não cozia cortiça, só cortava. Vendia ao Henrique Granadeiro, vendia cubos de cortiça para as rolhas.

O meu pai morreu aos 59 anos com cancro na pleura por causa do pó da cortiça.